sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

FRONTEIRAS DO MEDO

    A desconfiança e o medo presentes na cidade condicionam as interações sociais e separam os contextos marcados pelas diferenças. Ao mesmo tempo, a necessidade humana pela convivência social permite a formação de atividades coletivas e a utilização de ambientes públicos entre diferentes sujeitos e atividades. Mas, qual o equilíbrio entre a desconfiança e a interação de grupos sociais para a espacialização de um contexto coletivo mais satisfatório e seguro?
    As atividades urbanas e o uso das áreas livres públicas ocasionam situações (reais e hipotéticas) de perigo contra a integridade física e à saúde das pessoas: acidentes no trânsito, violência em áreas de conflito social, poluição do ar, barulho, insolação excessiva e a convivência forçada com sujeitos estranhos, que geram motivos para tonar a vida na cidade um risco constante.
    Reduzir esses riscos garantindo segurança e conforto nas metrópoles são serviços já prestados por empresas e instituições, que lucram com a insegurança e realçam ainda mais esta sensação quando abarcam com os efeitos do medo sem afetar suas causas. Carros blindados, sistemas de vigilância e condomínios murados tornam-se aparatos físicos que nos liberam da sensação constante de insegurança, ainda que delimitem nossa liberdade de ir e vir.
    A vida no ambiente urbano reduziu os riscos que eram onipresentes na vida selvagem junto ao ambiente natural. Porém, na maneira como a formação da cidade é conduzida na atualidade, a segregação dos grupos e indivíduos gera conflitos no espaço urbano onde as interações não são seguidas pelo reconhecimento das diferenças. A vida cotidiana promove encontros entre pessoas distintas em comportamento, etnia, gênero e classes sociais. Mas a criação de fronteiras a partir destas diferenças é o que gera uma cidade fragmentada e destituída de unidade na valorização do espaço público.
   Tais fronteiras são marcadas por diferentes distâncias e camadas de representação. Condomínios fechados, centros comerciais, clubes para associados, veículos particulares, formam subterfúgios para garantir maior segurança e isolamento, ao mesmo tempo em que definem novos padrões de comportamento para evitar a sensação de medo.
    Promover encontros segmentados entre grupos semelhantes é uma forma de garantir a interação social sem a geração de riscos por situações inesperadas. Tais convenções geram ambientes monótonos e situações previsíveis. Mas esse é o preço que se paga para evitar a insegurança do movimento aleatório da rua, onde coisas surpreendentes acontecem.

Marcos Sardá Vieira
Professor da UFFS e coordenador do PARK:
Publicação em Arquitetura e Urbanismo
Publicado originalmente no Jornal Bom Dia - Erechim/RS - Novembro de 2013

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